21.12.08

Os Sapatos do Major

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[...]
Há um ditado italiano que diz que não há maior felicidade do que termos companhia no infortúnio; se isso é verdade, devo ter sido muito feliz no Hospital de Lourenço Marques, pois não conheço outro lugar no mundo com tanto perneta para me fazer companhia.
Aos domingos uma parte da população vinha visitar os militares feridos em combate, e procurava saber coisas do Norte; era a parte da população que tinha consciência de que algo estava prestes a mudar. Conheci uma outra parte da população: a que achava que a guerra era uma coisa que se passava no distante Cabo Delgado entre a malta de Lisboa e os pretos; nada que uma matança a sério, e depois um apartheid à portuguesa não resolvesse. E depois… E depois havia as senhoras do Movimento Nacional Feminino. Havia qualquer coisa de patético nas senhoras do Movimento Nacional Feminino; qualquer coisa com sabor àquela doce degradação, só detectável no olhar de paciente mortificação das prostitutas dos bares de má fama da periferia das grandes cidades. Olhavam-nos com a distraída simpatia de quem tem por profissão distribuir calor humano em doses calculadas.
[...]

25.11.08

A Difícil Transferência do Ódio

Sessão de apresentação de "Cacimbados" na Junta de freguesia de Aguim no dia 7 de Dezembro, pelas 16 horas


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Éramos umas crianças. – Disse José da Fonte.
Os soldados são sempre crianças, Bastos, ainda se ao menos os que nos comandavam fossem homens, mas eram crianças como nós. E os que eram homens não iam para o mato. Lá em Mueda conheceste alguém do quadro, que alinhasse nas operações de canhota nas mãos? Profissionais da guerra que nunca deram um tiro e os que foram para lá ao engano é que lhes guardavam o coiro! – Disse José da Fonte.
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18.11.08

CACIMBADOS - Sessão de apresentação em Coimbra

Já à venda na FNAC online


Foto de Liliana Bastos


Foto de José D´Abranches Leitão


Fotos de Inês Bastos


Foto de Ana Rita Valadares


Foto de Liliana Bastos

19.10.08

EM BREVE NAS LIVRARIAS

Adquira este livro numa FNAC ou numa Bertrand perto de si, ou em breve neste blog.



Lançamento do livro CACIMBADOS

dia 15 /11 / 08 das 16:00 às 18:00
Na Casa Municipal da Cultura
R. Pedro Monteiro em COIMBRA

Honrar-me-á a tua presença.

Ao mesmo tempo o blog Cacimbo completará 5 anos de
existência, o que faz dele provavelmente o mais antigo blog
dedicado à Guerra Colonial

15.10.08

O Dia em que Comandei a Companhia

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[...]
Durante anos e anos, tenho revivido a imagem do enfermeiro Costa a tentar socorrer o Raimundo e depois a ir em busca do Lemos partido em dois no meio da picada, e por vezes tento imaginar o que seria ver essa imagem na televisão à hora do jantar, ou no café, no meio das risadas dos amigos, e acabei por perceber porque tantos de nós optam pelo silêncio. É por pudor que o fazem. Por não serem capazes de expor em público uma memória do foro íntimo. Seria como subir a um coreto para chorar um desgosto profundo. É algo demasiado valioso para ser tratado como um entretenimento passageiro, como um fruto que se sorve rapidamente cuspindo o caroço para o chão.
Os consumidores de emoções rápidas aprendem a não penetrar na essência das coisas; entendem das coisas apenas o que o olhar apreende; fazem com toda a informação o que fazem com a comida, mastigada à pressa entre duas tarefas urgentes e inadiáveis, dado que toda a fast-food é apenas para defecar. Não poderão entender as emoções envolvidas numa frase assim, aparentemente banal, "Vai socorrer o Lemos", dita entre a vida e a morte, entre a coragem e o medo, entre o instinto primário de sobrevivência e o altruísmo, entre o cumprimento do dever e o sentido crítico. Não poderão entender que um acto que envolva risco para quem o pratica só merece ser considerado corajoso se não for gratuito ou exibicionista, e se for consciente; isto é, é preciso sentir medo para se ser corajoso.
O Raimundo ia a comandar a companhia, foi ferido, recebeu o socorro corajoso do enfermeiro Costa, e fez ele próprio a triagem da emergência médica, secundarizando-se, ficando na berma da picada, escorrendo sangue do rosto, ainda sem saber se não ficaria cego. – Vai procurar o Lemos, Costa. Vai socorrer o Lemos.
Eu era agora o mais graduado da companhia. E era preciso continuar, era preciso estar à altura do cargo que recebi do Raimundo, era preciso encobrir o medo, cabia-me a mim agora fingir coragem. Mas fingir coragem, é na guerra, a única coragem possível.
Os helis vieram e levaram os feridos, a coluna organizou-se e continuou a sua missão. A tensão, o medo e um ódio indefinido tomou conta de todos como era costume.
E longe dali, os que verdadeiramente mereciam ser objecto do nosso ódio, aqueles que não tinham coragem de tomar decisões com medo de mudar o rumo da história, por não estarem à altura dos cargos que ocupavam, continuaram ainda por muito tempo a manter tudo na mesma, até que um dia o nosso ódio não coube mais em nós, e apeámo-los do poleiro. As mesmas mãos e as mesmas armas, e a mesma generosidade. Quando um povo é capaz de lutar e descobre que não são justas as causas que lhe deram, inventa uma.
[...]

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6.8.08

História de Amor com uma Guerra ao Fundo

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Depois a tarde ficou azul – céu e mar. E tu, mais nada. Tirei uma foto, quase nada ficou na foto, só azul. A seda da luz poente e a longa toalha das águas. De vez em quando alguém de muito longe devia puxar a toalha porque uma franja de espuma enrolava e desenrolava junto aos teus pés, e eu tinha um pensamento apenas: um dia vou lembrar-me que fui feliz aqui.
Ver-te daqui enquanto a luz da tarde amarelecia, era como pintar um quadro com o olhar. Não sei se era a praia que estava deserta se era eu que só te via a ti. Devia correr um ventinho do lado do promontório de onde D. Fuas ia caindo ao mar, porque o teu cabelo parecia desalinhado por uma carícia, depois viraste-te para aqui e vieste embora como se viesses atraída pelo meu olhar.
Saíste da praia como quem acorda devagar, e nasceu em mim uma urgência inexplicável de ficar a sós contigo, de ficar na intimidade absoluta dos nossos corpos, de comungar o síncrono prazer dos nossos gestos, de solver num só, as distintas essências dos nossos dois seres.
Agora que ainda sentes o mar arfando no teu peito, não ponhas essa música, que despertará ecos que ainda ressoam em mim, ao fundo, muito ao fundo, como uma nuvem negra que a aragem do mar vai afastando lentamente.
Talvez um dia eu me sente assim a teu lado e te conte a ti o que impus a mim mesmo esquecer. Quando eu era um outro e vivia uma outra vida num outro mundo. Então alguém inocentemente pôs uma música a tocar, uma música que nessa altura ainda nada significava para mim, mas que se impregnou dos silêncios e dos gritos, das longas solidões e das mitigadas alegrias. Uma música que se impregnou do sofrimento do próprio Tempo que penava dolorosamente e envelhecia sem avançar. Essa música devolve-me as vozes de amizades de sangue e de ódios viscerais. Essa música é o estertor do Tempo à beira do colapso. Agora deixa que isso permaneça esquecido como uma carta perdida no fundo de uma gaveta de um móvel antigo no sótão da casa de um avô há muito falecido.
Talvez um dia eu me sente assim a teu lado e te conte tudo, palavra por palavra, como se tivesse acontecido a outro, como se fosse um livro que li enquanto criança, um breve pesadelo que assombrou a minha infância. Mas tenho que estar preparado, porque pode acontecer-me que alguma antiga lágrima não chorada venha a intrometer-se na conversa. E então, poderás pôr essa música enquanto bebermos pelo mesmo copo e fumarmos o mesmo cigarro; mas nessa altura teremos uma longa história de amor e já nada nos poderá roubar todo o prazer que tivemos.
[...]
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20.7.08

Os Pára-quedistas

De António Silvestre - Ler texto completo aqui




Oito de Maio de 1972, terceiro mês na guerra da companhia 3503.
Tínhamos partido de Mueda para levar uma coluna a Omar e agora, já de regresso e após uma semana passada na picada, tentávamos a todo o custo ir dormir ainda nessa noite ao aquartelamento.
Omar, situado a meia dúzia de Kms do rio Rovuma e com a Tanzânia à vista, distava cerca de 75 Kms de Mueda , mas percorrer essa picada nos dois sentidos, levava sempre vários dias e muito sangue derramado das várias companhias que por aí passaram, pois as emboscadas, os ataques de morteiro e as minas, eram companhia obrigatória em todas as colunas realizadas nessa picada. Principalmente as minas que se contavam sempre por dezenas durante esse trajecto.
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António Silvestre - Ler texto completo aqui

2.7.08

O Sino da Minha Aldeia

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Diziam que um dia o roubaram. Diziam que um dia o resgataram. Os velhotes contavam coisas sobre ele como se se tratasse de um velho amigo. E contavam sempre como se fosse a primeira vez. Não para ensinarem nada, mas porque mastigar as palavras dava gozo.
Ouviam-se uns aos outros à porta de uma taberna, só para terem a certeza que o tempo não tinha parado.

[...]
E depois vinha mais uma rodada e a conversa ganhava gargalhadas de novo.
As mesmas conversas de sempre. Como se fosse a primeira vez que as contavam, a fingirem que nem se davam conta.
Tal qual como faziam ao ouvir o sino. E ele, chegando a altura, dava as horas; duas vezes, para os distraídos.
E a hora chegou, foram embora. O tempo passou num instante.


Ler o texto completo aqui

10.6.08

Voar no Google Hearth até Mueda

Com o tempo as imagens que colhemos de Mueda desbotaram, sobretudo as que trouxemos na memória. Quando os helicópteros se faziam à pista, parecia que nos íamos despenhar de encontro àquelas ravinas, e não seríamos os primeiros. Agora podemos reviver esse momentos quantas vezes quisermos na segurança da cadeira do computador.
Quem ainda não tem, que descarregue a aplicação do Google Hearth. Depois basta escrever: Mueda, Moçambique para voar até ao planalto dos Macondes e repetir vezes sem conta a abordagem da pista que fazíamos sempre com um misto de alívio e de temor.
Podemos ajustar a vista a pouco mais de um quilómetro de altura, com a máxima definição.

Ver mapa maior

27.5.08

Carta a Mueda - Caseiro

Texto de José Caseiro - Ler o texto completo aqui.






[...]
Do posto de água 9 ao 34, do 34 a Omar, ou do 34 a Mocimba do Rovuma e a ida a Muera; muitas batalhas de vida e de morte se travaram, onde infelizmente a morte em algumas venceu.
Do China ao Chindorilho, das Águas às Bananeiras, e de ti Mueda a Nanglolo, a morte esteve sempre presente, mas por distracção sua ou porque não estava interessada, a maior parte dessas batalhas foram ganhas por esses valorosos rapazes da C.ART. 3503 e talvez sejam esses que te amam, porque do ódio pode nascer o amor, segundo dizem os filósofos; ou quem sabe, passados estes anos é que o nosso amor por ti tenha nascido. [...]


José Caseiro

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9.5.08

O Niassa

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[...]
A pouco e pouco os soldados foram saindo do porão. Como se o silêncio do barco os tivesse assustado, e surgiam nas aberturas do convés como zombies, que ao chegarem à luz do sol caíam fulminados. Ou então como vermes escuros, em novelos que se desenovelavam para se espalharem por todo o lado.
Com o seu aparecimento, parece ter ficado mais nítido o bafo intestinal que o Niassa exalava por aquelas cloacas abertas no convés, compondo um complexo bouquet em que se misturavam, num equilíbrio bem doseado, o aroma sulfídrico dos dejectos, o amoniacal da urina e o agridoce do vomitado; rematado com o fénico do peixe podre e o ranço da banha do rancho geral; tudo sobre uma base persistente do bolorento mofo ancestral dos porões. Era dessa atmosfera de compostagem que os soldados emergiam para o ar vibrante de luz e calor, sob um sol tórrido.
[...]

Foto cedida por José Monteiro

Eu regresso ao interior do bar e os soldados regressam aos porões, como se tivessem posto o filme a andar para trás. Eu fujo para o conforto do bar. Os soldados fogem para o sufoco do porão; fogem de uma tortura para outra tortura.
Percebo agora o conselho cristão para oferecer a outra face; é seguramente para não nos estarem a bater sempre na mesma.
Ainda restam alguns soldados a esturricar ao sol. Estes não tiveram forças sequer para descansar a face dorida e oferecer a outra. A que missão urgente vamos nós acudir para que sejamos tratados como escravos? Será que foi por isso que o Niassa parou? Porque ficou indeciso, dado que os negreiros costumavam rumar em sentido contrário?
[...]

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23.4.08

Tão Tarde pela Madrugada

(Uma breve explicação do 25 de Abril às pessoas muito, muito estúpidas)



Explicação do 25 de Abril – Óleo sobre Tela - 1975



Quando os homens são maiores que o chão que pisam não há limites para a ambição.
Chegara pois o tempo do Infante que via sempre um pouco mais para além do horizonte; um homem que não cabia no chão que lhe deram.
Foi por isso que Portugal ficou maior que Portugal.
Portugal do tamanho da visão de um homem.
Portugal hiperbólico, ubíquo, global.

O Infante ia à frente da História e levava consigo a nação inteira, e a História teve que seguir atrás de Portugal.
Ainda a Europa toda pensava que o mar acabava onde começava o medo, e o Infante inventou o mar para além do medo, e deu-lhe um dono: Portugal.
E Portugal cresceu até onde existia mundo; porém nenhuma pátria é suficientemente grande se não deixar crescer os homens dentro de si.
E também nenhum despotismo é suficientemente eficaz para evitar que um dia os negreiros se transformem em escravos.

E assim chegara o tempo do segundo Infante, o descobridor de Portugal para aquém do medo, o navegador às arrecuas, o anti-Infante.
Já a Europa toda sabia que a Liberdade era a maior dimensão humana, e Portugal ainda cultivava a pequenez do medo.
Portugal implodido, paroquial, microcéfalo, autofágico.

Que imperialista pode ser tão tacanho que a sua ambição ocupe apenas o espaço dentro das próprias botas?
Em Portugal, homens livres, só os que estavam na prisão.
Os jovens combatiam em distantes paragens enquanto os seus pais se sentiam cativos em casa.
Os camponeses abandonavam a terra solteira, partindo como fazem as andorinhas quando já não acreditam na Primavera.

E quando os filhos da pátria regressavam finalmente a casa, a juventude amortalhada de silêncio, o último grito congelado no rosto, traziam, no sítio destinado à alma, o relento pútrido da guerra longínqua.
Um manto de viuvez cobria as aldeias e os campos, e uma dor calada asfixiava a esperança no peito.
Portugal estendido pelo mundo inteiro, e os portugueses dentro de casa com falta de ar.

Mas nenhum tirano pode mobilizar a coragem do seu povo para defender um império distante, e impor que viva cobardemente na sua pátria.
Por isso, não faltaram vozes ocultas a traficarem a esperança nas esquinas cúmplices da noite.
Há sempre quem mantenha o lume aceso, mesmo quando ele esmorece na alma dos homens.
Há sempre quem sopre, sopre de mansinho, como quem passa a palavra, para que no âmago do carvão mais escuro se mantenha uma, ainda que ténue, brasa de esperança.

Que longa que foi a noite. Como tardava a amanhecer. Como é sempre mais difícil dobrar o insignificante Cabo Bojador, dentro de nós.
Porém finalmente os portugueses descobriram Portugal, acordando nele.
É que se não derem uma causa justa a uma geração inteira de combatentes, eles inventam uma.
E nunca as armas foram empunhadas tão rente à poesia.
Nunca antes os soldados combateram dançando com o povo.
Nunca o ar da madrugara tão leve.

E o Adamastor que nos asfixiava de medo transformou-se num rato, temendo a vingança daqueles que anoiteceram oprimidos e amanheceram livres.
Os tiranos tremeram.
Os esbirros assanharam-se inutilmente de pavor.
E os muito, muito estúpidos ainda continuam a perguntar-se porque vieram de repente todos os portugueses para a rua.

Os portugueses apenas navegaram mais uma vez para além do medo.
Os portugueses vieram para a rua só para respirar.

5.4.08

Mueda Revisitada

As mil palavras que valem uma imagem ficam patentes aqui.
É certo que estas imagens estão guardadas dentro de nós; não materializadas em linhas e em cores mas em sentimentos intensos e memórias que a morte, e antes da morte, só a senilidade, há-de apagar.
Mueda das minas e das emboscadas. Mueda da saudade e da morte. Mueda do aldeamento, do China, da Águas… Mueda da nossa juventude.
Na guerra demos todos os humores de que somos feitos: muito suor, algumas lágrimas... e tanto sangue, meu deus; mas demos sobretudo a vida. Quem não a deu toda de uma vez, deu pelo menos uma parte… a melhor. A parte da Juventude.
Mueda não é nossa, se calhar nunca foi, mas nós somos de Mueda. Somos de Mueda não por termos nascido lá mas por lá termos conhecido a Morte, essa grande prostituta que nos seduz, nos domina e que nós vamos enganando como pudemos.
É por isso que às vezes sentimos Mueda chamar.
Alguns respondem a esse chamamento fechando o ciclo da memória, fechando o impossível arco do tempo. Obrigando-o a recuar até onde deixámos as nossas emoções, os nossos sentimentos, parte da nossa vida.

As fotos provam que Mueda existe. Não fossemos pensar que foi um sonho ou um pesadelo.

A viagem fizeram-na João Azevedo e um grupo de amigos. As imagens partilham-nas connosco.
Bem hajam!

Manuel Bastos

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Maputo - Hotel Polana


Maputo - Museu


Maputo - Namaacha

Pemba - Baia


Sagal



As Águas ( A estânia termal de Mueda)



A Picada das Águas


Mueda - Messe de Oficiais



O Edifício do Comando


A Porta de Armas é hoje um memorial ao 2 de Setembro e
uma homenagem ao artista maconde


A Curva da Morte... sinistra, o alcatrão a cobrir o sangue dos mortos


A Picada do Chindorilho - A roleta russa das minas
(Foi aqui a última vez que apoiei os dois pés no chão)


O China

Miss Mueda 1972 - "A filha do China"

A "Avenida" principal de Mueda...

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Traduzir a felicidade deste regresso a terras moçambicanas é de difícil descrição e por isso deixamos em “O Combatente da Estrela” o nosso testemunho fotográfico de um percurso que aconselhamos a todos quantos sintam o mesmo desejo de um dia voltar a este longínquo país do Índico.

Voltaremos? Pensamos que sim.
África e Moçambique chamarão sempre por nós. Ali somos Benvindos.
Kanimambo.

João Azevedo

21.3.08

Merecer a Água que se Bebe

Texto de José Caseiro em Histórias da CART 3503


Estávamos no mês de Dezembro do ano 1972 em Mueda, quando nos foi dito a título sigiloso que a CART 3503 ia levar a cabo uma grande operação hélio transportada.
Sendo uma actuação a nível de companhia o capitão não pode escapar e assim se viu em pleno mato, onde estivemos seis dias; e num desses dias fizemos um achado, que este senhor considerou como troféu de guerra, o que afinal não passava de algumas granadas e um grande número de munições de vários calibres.


Ler o texto completo do Caseiro em Histórias da CART 3503

9.3.08

A Incerteza do Sol Nascente

Ler texto completo em Aguim em Mim ou na pág. 8 do Elo da ADFA



[...]
Havia dias, como hoje, em que o pôr-do-sol pintava tudo em cores quentes e do terraço eu olhava-o seguro de que Deus o haveria de fazer nascer no dia seguinte, e depois ia dormir sem remorsos. Mas hoje sei menos do que quando era criança; olho o sol e não acredito que Deus tenha as coisas sob controlo. Pode muito bem acontecer que se esqueça de o fazer nascer amanhã. Hoje não irei dormir sem remorsos.

Ao menos se a voz quase humana de um violoncelo acordasse o calor das vozes esquecidas; ou o som da chuva na vidraça, tão próximo da música, restituísse a alma a esta casa deserta; ou faltando tudo o mais, se ao menos um eco, que tivesse ficado reverberando por entre estas paredes dissesse o meu nome e perguntasse “Já viestes?” só para eu ter a certeza que regressei a casa…

Espreito pelo vidro sujo da janela para o pátio onde falta a velha figueira. Como morreu a velha figueira? Sinto uma dor imensa por não me lembrar; como se tivesse perdido a oportunidade de lhe dizer algo de muito importante e íntimo; como se tivesse remorsos de não ter vertido uma única lágrima pela sua morte. Até parece que uma música parou repentinamente dentro de mim. Talvez por isso a laranjeira se recuse a dar laranjas, ressentida pela minha ingratidão. Não sabe que as comíamos apenas por amizade, dado que eram um pouco azedas “São muito boas para acompanhar o leitão” desculpava-a o meu avô, que a conhecia desde pequenina… e nós sorriamos de ternura.

Também devo ter sido infeliz aqui, mas não me lembro.
[...]

Ler texto completo em Aguim em Mim ou na pág. 8 do Elo da ADFA

27.2.08

Heróis?! - 2

Texto de António Almeida Comandante da CART 3503





Continuação daqui

Numa pequena mesa, cartas na mão, os comandos «superiores» fingiam não escutar as «bocas» daquele médico feito «major», que os «operacionais» tinham como grande amigo.
A proximidade da época natalícia, e do fim do ano tornavam o ambiente ainda mais tenso que o normal. Toda a companhia preparava a sua festa de Natal. A «Companhia Macaca» com um pinheiro, símbolo clássico lá longe, na terra, e a que os soldados africanos aderiam, colocado no meio da caserna, criou o ambiente possível para esquecer, ou pelo menos, tentar amenizar as saudades, uma vez mais, exactamente naquela que é por todos considerada a festa da família.

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21.2.08

Ex-combatentes na Guiné com ajuda na bagagem

in Jornal de Notícias, 21 de Fevereiro de 2008.por Leonor Paiva Watson.


Um grupo de ex-combatentes na Guiné parte hoje para aquele país com a missão de entregar 22 toneladas de material didáctico e de saúde a uma organização não-governamental (ONG) que fará a gestão dos recursos por forma a que estes cheguem a milhares de pessoas.
[...]
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4.2.08

A Dor Fantasma


Ó Manuel (a minha mãe pronunciava sempre todas as sílabas do meu nome) está ali uma senhora que quer falar contigo.
Eu fui de canadianas até à sala e a senhora levantou-se e desatou a pedir desculpas numa torrente de palavras que não me dava hipótese de falar.
- E o meu home' chama-me tola, aquele bêbado diz qu' isto é maluqueira minha. E mostrou a mão a que faltava o polegar. – Qu' eu não devia vir incomodá-lo. Mas disseram-me q' o senhor tinha ficado sem uma perna em África e eu tinha que vir cá. Não estou nada maluca 'tão não?
Ainda o pó não tinha assentado bem na picada, e o Lemos para o enfermeiro Costa: – Eu sinto as minhas pernas… eu não fiquei sem as pernas, pois não, Costa? E nós a segurarmos o soluço na garganta.
Ainda nesse mesmo dia, no Hospital do mato em Mueda, o cirurgião, num exercício didáctico de psicoterapia, a explicar-me a mim que o que eu sentia era psicológico, que o fenómeno se devia ao facto de o amputado não aceitar a mutilação e isso gerar alucinações, induzindo na imaginação a presença do membro perdido. Que a dor que eu sentia era um sonho, era o desejo da preservação da integridade anatómica do corpo. E o cabo enfermeiro: - Ó furriel, isso são só as dores fantasmas, 'tá pe'ceber?

[...]

Ler o texto Completo aqui

16.1.08

A Primeira Mina

Texto de António Silvestre - Ler texto completo aqui



[...]
E lá fomos novamente eu e o meu ajudante, agora com alguns curiosos atrás que queriam ver com os seus próprios olhos o que teria acontecido. Com o máximo cuidado aproximámo-nos lentamente e verificámos que não havia nenhum mistério, simplesmente o cordão lento que já era velho ardera apenas um bocado e apagara-se, por sorte não era cordão detonante, pois os checas tinham pegado no primeiro cordão que encontraram e foi esse que utilizaram.

Resolvemos começar tudo de novo e enquanto eu preparava o detonador e o petardo, o meu ajudante, já mestre, cortava um bocado de cordão lento agora bastante maior, cerca de 25cm e desfiava os lados do mesmo para que este pudesse arder nas melhores condições. Depois de tudo novamente preparado, acendemos o rastilho, esperámos um pouco para ver se ele não se apagava e como verificámos que estava a arder normalmente iniciámos nova corrida e abrigámo-nos debaixo do rebenta minas. De repente um estrondo enorme, pedras e areias a cair por todos os lados.

Olhei para a picada e um cogumelo elevava-se no ar e um cheiro diferente entrava-me pelas narinas, cheiro esse que me iria acompanhar muitas vezes e que fiquei depois a saber que era o que os velhinhos chamavam “cheiro a trotil“.
[...]

Texto de António Silvestre - Ler texto completo aqui

8.1.08

Saudade de Azul

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[...]

A minha vida parece uma tarde de chuva na praia, a baba da chuva a escorrer na pala da barraca e as gaivotas murchas no areal deserto. E eu sentado a fumar um cigarro e a olhar pra ontem. Às vezes chovia assim em Moçambique mas nós nunca parávamos por causa disso. Porque havia eu de ir embora daqui? – Ó Zé, anda embora que vai chover. E eu cá pra mim: Vai-te fornicar. Que vou eu fazer para casa? Um gajo casa com uma mulher jeitosa e a pouco e pouco ela fica seca como as palhas, e não tarda nada ficamos com a impressão que nos distraímos e casámos com a sogra.
[...]

Às vezes dou pela Zulmira na cozinha a abanar a cabeça e a olhar para mim quando me sento à frente do microondas para ver o telejornal ou quando tento aquecer a sopa na televisão; mas que tem de mais? Ela tem os dois aparelhos na cozinha ao lado um do outro, e eu sou um bocado distraído, mais nada. Às vezes pego no telecomando para fazer um telefonema ou no telemóvel para mudar de canal mas isso é porque não me dou com estas tecnologias de agora, aquilo para mim é tudo igual, e ela a abanar a cabeça…
- Põe os olhos no nosso Mário, a combater em Timor e sempre tão cheio de coragem. E mostra-me a foto do catraio com aquele nariz curto, tão parecido com o patrão dela. Demasiado parecido com o patrão dela. Eu quero que eles se forniquem todos. A combater, a combater quem? Algum deles alguma vez ouviu uma Kalash, uma costureirinha, um morteiro 122? Eles sabem o que são minas e fornilhos? Está tudo muito certo, sim senhor, mas o catraio foi pra lá por causa do guito e agora esta gaja fala dele como um herói e mostra-me a foto com aquela tromba curta a lembrar-me o amante.
[...]

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