24.9.07

O Dia em que se Viu Mueda a Arder

Às vezes a solidão obriga a confrontarmo-nos com as coisas mais básicas da existência e nem o Tempo, esse grande déspota, apaga completamente o que uma vez teve verdadeiro valor para nós. Deixem-me recordar-vos a coragem de meia-dúzia de homens n’ “O Dia em que se Viu Mueda a Arder”. Coragem sim; essa sublimação do medo em generosidade.



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[...]

Não sei, nem nunca aprendi a conhecer um herói; a não ser talvez quando um enfermeiro desarmado nos socorre na picada; a não ser talvez quando um soldado se esquece momentaneamente de si para se lembrar dos outros, como ali o Caseiro e o Silvestre.
Pôr a própria vida em perigo para salvar uma nação inteira é um acto heróico por certo, mas pagar o mesmo preço para salvar um punhado de amigos acossados pelos guerrilheiros no meio do mato é sem dúvida um acto mais heróico ainda, que o valor da nossa coragem está naquilo que se oferece e não no que se recebe. [...]

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3.9.07

Louvor e Punição

É preciso dizer que acreditámos em vocês? É preciso dizer que acreditámos até ao ponto de a vossa mentira ser um insulto à nossa inteligência? Que credo era o vosso, do qual apenas nos contaram a parte que dizia respeito ao nosso dever?
Os soldados têm que estar à altura da missão que lhes confiam. Os políticos têm que estar à altura do momento histórico em que vivem e os comandantes militares têm que estar à altura de ambos.
Sabemos hoje, todos os que ainda não sabiam nessa altura, que os políticos portugueses que mantiveram a guerra colonial viviam orgulhosamente autistas num momento histórico anacrónico; sabemos que os soldados portugueses fizeram o que se lhes pediu como todos os soldados fazem em todas as guerras; e os comandos militares? Será que ao menos respeitavam aqueles que lhes ganhavam os louvores e as condecorações, com o seu suor, o seu sangue e os seus traumas?
Cada um que fale pela experiência que tem.
A CART 3503 combateu durante dois anos e dois meses, teve 58 baixas; durante esse tempo teve 6 (SEIS) comandantes e no mês de Junho de 1972, segundo os registos da unidade, já tinha sofrido 2 feridos, destruído vinte e quatro minas e feito 5 mortos ao inimigo, quando finalmente o comandante do batalhão decidiu louvar um dos seus homens. Quem? Será que louvou um militar dos que arriscaram a vida no mato e nas picadas? Ingénuos! Leiam só:

[…] o Exmo Comandante do B. Caç. 15, louvou o 1º. Sargento de Artª. NM-(xxxxxxxx) – Jxxxxx, desta CART., porque em todo o tempo que exerceu as funções de 1º sargento, responsável pela escrita da companhia, sempre levou a bom termo os inúmeros dele dependentes de forma pertinente e eficaz.

A omissão do número mecanográfico e do nome do sargento devem-se ao meu respeito pela preservação da sua identidade, a pobreza do português deve-se ao louvado sargento que foi quem escreveu isto, embora lhe tenham sido reconhecidos inúmeros. Inúmeros?! "inúmeros" quê? Parece que ninguém lhe identificou os motivos para o louvor, apesar de serem "inúmeros" e de os ter "levado a bom termo".
Mas até essa data, além dos factos acima descritos pelo menos 5 militares já se tinham evidenciado por actos de coragem, ao ponto de serem mencionados pelos seus respectivos comandantes nos relatórios de operações.
Até ao nosso primeiro morto ter ocorrido, os únicos militares louvados foram os que fizeram doações de sangue, o impedido da messe e nosso primeiro-sargento.
Daí até ao fim da comissão, muita coisa ocorreu, muitos comandantes vieram e foram embora, mas a CART 3503 continuou lá, não como chegou, porque foram muitos os que tombaram em combate, e continuou lá muito para além da sua obrigação. Cinquenta e sete dias de guerra para além da sua obrigação, para sermos precisos.
E quando chegou finalmente o dia tão esperado para a sua partida, adiado numa sucessão interminável de cinquenta e sete dias? Que se espera de um grupo de homens que deram o melhor de si, quase tudo de si, e que finalmente vêm o fim do seu degredo e do seu martírio? Alegria, não é? Normal, não?
Ingénuos! Isso é para vocês, que não sabem que entre os políticos que não estavam à altura do momento histórico e os soldados que aceitaram cumprir o seu dever como em todos os momentos da história, existia uma classe de pessoas que viviam à sombra dos primeiros e à custa dos segundos.

NOTA DE PUNIÇÃO

puno com repreensão agravada o capitão milº. de Infantaria ANTÓNIO PEREIRA DE ALMEIDA, da C.ART. 3503, porque, sem para isso estar devidamente autorizado, tomou parte numa exteriorização de alegria, levada a efeito pelo pessoal da sua companhia, no dia 05ABR74, entre as 21 e as 24 horas, originada pelo final da comissão e regresso à Metrópole, […]

Não omito o nome do capitão punido, porque há punições que nos dignificam por revelarem um tal nível de estupidez que deveras embaraçoso seria recebermos um louvor.

É sim. É preciso dizer que acreditámos em vocês, políticos e comandantes. É preciso dizer também que jamais esqueceremos isso. Nós aprendemos. E vocês? Será que vocês já aprenderam a estar ao nível do momento histórico em que vivem?
Duvido. A estupidez é crónica.